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Book Stories 2.0

Porque todos os livros contam uma história

Book Stories 2.0

Porque todos os livros contam uma história

A história real de 'Madre Paula' é apaixonante!

Book Stories, 07.05.23

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Patrícia Muller surpreendeu-me bastante com o seu livro ‘Madre Paula’. Não que houvesse uma razão concreta para eu não estar à espera que o livro fosse bom, mas por que não achei que a história tivesse condimentos suficientes para me prender a leitura.

Aliás, este foi um dos livros que se andou a arrastar na minha estante durante largos meses. Erro crasso!

Devorei o livro em duas tardes. A história interessava-me, aliás já tinha visto a série na RTP há uns anos, e, apesar de não me lembrar muito bem, sabia que tinha gostado da história.

A obra começa com a ida de Paula para o Mosteiro de Odivelas. Primeiro ponto interessante: nos séculos passados era comum as famílias mais pobres enviarem as filhas para mosteiros por não terem condições para as sustentar.

E é neste contexto que Paula é enviada para o mosteiro de Odivelas onde, inclusivamente, já lá vivia uma das suas irmãs, a Luz.

Os primeiros capítulos mostram-nos a hipocrisia que se vivia – e em alguns aspetos ainda se vive atualmente. Os nobres e até o próprio rei faziam de freiras as suas concubinas e como se tal não fosse já pecado bastante, ainda o faziam dentro do Mosteiro, na casa do Senhor.

A minha casa é um palácio dentro da quinta, incomparável a qualquer outro. O primeiro quarto é forrado a seda vermelha com fitas em ouro, espelhos nas paredes com relevos e fugiras douradas. Estes aposentos foram construídos dentro do mosteiro

Além de transformar o mosteiro num autêntico bordel, o Rei D. João V – responsável, entre muitas outras coisas, pela construção do magnífico Mosteiro de Mafra – mandou também construir aposentos reais dentro da casa do Senhor para que a Madre Paula, a sua amante por mais de uma década, vivesse rodeada de luxo.

A autora descreve-nos ao detalhe os aposentos, os detalhes dos vestidos de Paula e até da lingerie, o que mostra como Patrícia Muller teve o cuidado de investigar as indumentárias que se usavam no século XVIII. A sua escrita é impecável e os capítulos pequenos a terminarem quase sempre em momentos-chave torna a leitura fluída, aguçando-nos a curiosidade a cada capítulo.

A Madre Paula foi uma mulher do seu tempo que aprendeu com os seus erros e lidou com as consequências.

Há vários detalhes nesta história que, infelizmente, percebemos que ainda têm lugar nos dias de hoje. Neste caso concreto falo da freira Madalena Máxima de Miranda – que foi a amante do rei antes de Paula – ter humilhado a então noviça Paula. Por um lado, por ser pobre, e, por outro, por ver nela uma ameaça pela preferência do rei.

Não sabia que as mulheres podiam ser tão pérfidas umas com as outras, ao ponto de se humilharem mutuamente e pelos motivos mais disparatados. As mulheres não se amam entre si. E isso torna-as mais vulneráveis

Mas Paula não se ficou e vingou-se em dois atos. Primeiro, matando-lhe o gato a sangue-frio. Depois, e já sendo a preferida do rei, exigindo ao monarca que separasse Madalena do filho bastardo real que havia dado à luz.

Ao longo dos mais de dez anos em que foi amante do rei, Paula passou por momentos de luxo e luxúria; foi adorada e odiada; foi doce e amarga; foi fiel ao rei de quem, naturalmente, não tinha fidelidade.

E tudo mudou quando Paula engravidou e deu à luz um filho homem. Foi nesse momento que sentiu estar a pagar pelos seus erros cometidos com Madalena, pois a rainha retirou-lhe o filho e, para se retratar deste e outros pecados – como chicotear as suas escravas –, Paula afastou-se do rei e criou, juntamente com o seu filho, o filho de D. João V e Madalena Máxima.

O que mais gostei no livro foi a capacidade de a autora ter documentado o crescimento pessoal e sentimental de Paula, uma mulher que foi obrigada a ser freira, que foi má e vingativa, mas que nutriu um grande amor por D. João V, um amor que colocou a sua vida em risco, um amor que durou para lá da morte do rei.

Paula viveu no mosteiro até morrer e teve o rei no seu coração até ao momento em que Deus a levou para junto de si, deixando para trás muitos arrependimentos, mas também a certeza de que amou e foi amada pelo então homem mais importante do mundo.

Quanto ao rei não nos são dadas muitas pistas sobre quem foi afinal D. João V. Através dos olhos de Paula vemos um homem apaixonado, capaz de fazer tudo para conseguir o que quer, capaz de humilhar publicamente a sua rainha – toda a corte sabia da sua relação amorosa com Paula e dos luxos que lhe atribuía – mas também um homem que “acreditava na sua demanda pessoal” e que acreditava que “tinha uma missão, com os seus perigos e encantos”.

Eis uma personagem que quero conhecer melhor. Se conhecerem livros que retratem o rei D. João V, por favor, digam-me nos comentários.

 

✅ Os diálogos são tão reais que parece que os estamos a ouvir ao vivo

❌ Nada a apontar

⭐ 4,5

Em 'A Morte Dela Fica-me Tão Bem' encontra amor, adultério e crime

Book Stories, 01.05.23

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'A Morte Dela Fica-me Tão Bem' marca o regresso de Miguel Viana Baptista à escrita, desta vez com a chancela Quetzal Editores e um romance elegante sobre amor, adultério, crime, classe média – e a tragicomédia do ciúme.

Disponível nas livrarias desde 20 de abril, terá sessão de lançamento a 11 de maio, às 18h30, na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa, com apresentação de António José Teixeira.

Num fim de tarde de maio, Simão Sousa Santos, advogado conhecido pela sua experiência em casos de divórcio, recebe uma nova cliente, a dermatologista Carla Trancoso.

Simão é um homem de 50 anos, casado pela segunda vez, que pertence a uma sólida burguesia lisboeta. Tem uma paixão quase obsessiva pela escrita: da grande literatura, que consome vorazmente, à que ele próprio pratica, num registo íntimo, introspetivo e memorialista.

Contudo, o seu diário e a aparente estabilidade que se espera de alguém como o advogado Sousa Santos vão ser dramaticamente postos em causa pela aparição desta bela mulher perfumada de flor de laranjeira – Carla, uma ameaça raríssima.

O que começa por ser um lamento e um exercício literário transforma-se num policial, quando o seu autor se enreda num crime. Ou será ao contrário? São certamente um e outro.

 

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'O Raposo' num triângulo feito de amor e ódio

Book Stories, 26.03.23

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Jill e Nellie levam uma vida pacata, retiradas na sua quinta, onde não contam com qualquer ajuda masculina. Quando um raposo começa a atacar a capoeira, Nellie pega na arma, mas, apesar de o ter na mira, é-lhe impossível disparar. Chega então à quinta um jovem soldado, vindo da guerra, e abala definitivamente a estabilidade daquela relação de amor e companheirismo entre as duas mulheres.

 

Publicado pela primeira vez em livro em 1923, 'O Raposo' é uma das mais célebres histórias narradas por D. H. Lawrence. 

Explorando temas como a sexualidade, o papel ditado a cada género pelas normas sociais e o fatalismo da transgressão, esta é uma novela breve mas poderosa, reveladora da irreverência que marcou a produção literária deste que é um dos grandes escritores ingleses do início do século XX.

O livro, editado pela Livros do Brasil, já se encontra em pré-venda e estará disponível nas livrarias já amanhã!

Tendo por cenário a Inglaterra rural da Primeira Guerra Mundial, esta história já adaptada ao grande ecrã em 1967 aborda questões estruturais da obra do autor britânico, explorando a tensão psicológica de um triângulo de amor e ódio.

 

'Eu, Maria Pia': A história de uma rainha contada por uma duquesa!

Book Stories, 21.03.23

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Eu, Maria Pia’ é uma espécie de diário daquela que, nascida em Itália, foi rainha de Portugal entre 1862 até 1889.

A autora, Diana Cadaval, traz-nos a história da Princesa Maria Pia de Saboia primeira pessoa. Uma história que começa ainda na infância da princesa, quando perde a sua mãe – um episódio que a marcará ao longo da sua vida – e acaba na sua morte.

Com apenas 14 anos casou-se com o rei D. Luís e ficou maravilhada quando chegou a Lisboa e viu a euforia com que os portugueses a receberam.

Também D. Maria se sentia eufórica, não só pela forma como havia sido recebida, mas especialmente porque estava apaixonada pelo marido e o marido por ela. Os primeiros tempos de casamento foram um sonho para a jovem rainha.

Porém, e como muitas vezes aconteceu ao longo da história da monarquia, o rei acabou por se desinteressar pela sua esposa, direcionando a sua atenção para outras mulheres da corte.

Este facto partiu o coração à rainha que via o seu sonho de casamento feliz chegar ao fim.

Criada num ambiente cultural e eclético, D. Maria Pia tentou implementar estas características em Portugal. O Palácio da Ajuda é o melhor exemplo dessa tarefa que assumiu em mãos.

A monarca, desiludida com a vida de casada, aplicou toda a sua mágoa na renovação do Palácio da Ajuda, levando conforto para a família real ao mesmo tempo que o transformava num lugar luxuoso pronto a receber os mais ilustres convidados, fossem nacionais ou internacionais.

Porém – e porque nem tudo são rosas – D. Maria Pia começou a gastar verdadeiras fortunas na decoração do Palácio, mas também com as suas indumentárias que mandava vir de Paris.

Ao mesmo tempo, começava a sentir-se uma forte agitação social, pois o povo passava fome.

Maria Pia, tal como nos mostra o livro, era uma mulher dividida. Se por um lado tinha gostos requintados que custavam balúrdios aos cofres do reino, por outro lado era uma mulher solidária que, várias vezes, distribuiu dinheiro pelos pobres.

Ao ler o livro de Diana Cadaval, a sensação que me dá é que a rainha encontrava nos pobres o perdão para os seus excessos. A monarca, se por um lado sabia a quantidade de dinheiro que gastava, por outro justificava-a com a necessidade de a Casa Real manter o seu bom-nome e imagem junto das monarquias europeias.

A imagem que fica desta rainha – pelos olhos da autora – é que D. Maria era uma mulher desiludida com a vida, por esta não ter corrido como sempre havia sonhado e, por isso, encontrou na decoração, nas joias e nas roupas o seu refúgio que funcionava até como vingança.

Ao gastar o dinheiro do reino, D. Maria Pia vingava-se das traições do marido e da humilhação que estas lhe provocavam e quando sentia o peso do seu comportamento dedicava-se, então, a fazer caridade.

Quer-me parecer que a rainha sofria de dupla personalidade!

Mas havia ainda outra faceta da princesa italiana: era uma mãe muito cuidadosa. Em certo momento da infância dos filhos, D. Maria salvou-os de morrerem afogados, arriscando, para isso, a sua própria vida.

A rainha foi obrigada a sair do país em 1910 devido à implementação da República, isto depois de ver o seu filho e neto, D. Carlos e D. Luís, respetivamente, serem assassinados por republicanos, tendo acabado por morrer aos 64 anos num elevado estado de demência.

Este livro mostra-nos como a rainha terá vivenciado os diversos episódios que a marcaram como jovem, como rainha, como mulher e como mãe.

 

✅ Uma viagem rápida pela vida de uma rainha que conquistou e perdeu os seus súbditos e a quem a vida tirou tudo; escrita simples e leve

❌ Alguma presunção da autora em colocar-se na pele da rainha. Teria gostado mais do livro se fosse escrito na terceira pessoa

⭐ 3

 

A crítica em 'Madame Bovary' valeu a Gustave Flaubert idas a tribunal

Book Stories, 18.03.23

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Em ‘Madame Bovary’, de Gustave Flaubert, encontramos uma história de esperança, de expetativas e de uma busca falhada por um amor que só existe nos livros ao mesmo tempo que somos confrontados com a realidade de uma sociedade burguesa do século XIX.

O autor começa por nos apresentar Charles Bovary, um médico que é casado, mas que acaba por se apaixonar pela filha de um seu paciente.

Um ano depois fica viúvo e então decide pedir a jovem Ema em casamento, que logo aceita, sonhando com a vida de casada que leu nos romances de que tanto gostava.

Porém, o casal muda-se para uma zona do interior e logo começam as deceções de Ema, cuja vontade era a de viver numa grande cidade. Esta vontade torna-se ainda mais vincada depois de ter sido convidada, juntamente com o marido, para um baile na mansão de um marquês.

Ema vê então tudo aquilo que quer ter: vestidos, bailes, criados, amigas da alta sociedade. Enfim, a jovem encontra numa realidade que não é a sua aquilo que sempre leu nos livros.

Ema e Charles eram como o dia e a noite: ele muito recatado, ela muito deslumbrada.

Esta é então a primeira crítica feita pelo autor, uma crítica profunda aos valores fúteis da burguesia do século XIX em que tudo o que importava era apenas e somente as aparências. O amor era algo perfeitamente dispensável – pelo menos, à primeira vista. E, no entanto, era com o amor que as jovens mulheres sonhavam.

Face a todo este descontentamento, Ema decide que precisa de emoção e paixão na sua vida, o que a leva a cometer adultério numa busca pelas emoções que tanto leu, mas que nunca vivenciou.

Este livro é um importante marco na literatura da época, pois afasta-se do romantismo e é um dos inauguradores do realismo literário.

As críticas à sociedade, aos valores que eram impostos à luz mas que eram deturpados à sombra, ao papel ditatorial da igreja valeram ao autor idas a tribunal.

Ema é uma mulher sonhadora sempre em busca de mais e mais, o que a leva a perder a pequena fortuna gastando o seu dinheiro e o do marido em futilidades e com os seus amantes.

O final é triste e trágico para ambos que não vão ser capazes de enfrentar, por um lado, as consequências dos seus atos, e, por outro, a cegueira provocada pelo amor e por uma personalidade paciente.

Quem também tem um final infeliz é Berta, a filha do casal.

 

✅ o retrato perfecionista de uma sociedade burguesa do século XIX

❌ descrições demasiado extensas

⭐ 4

 

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