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Book Stories 2.0

Porque todos os livros contam uma história

Book Stories 2.0

Porque todos os livros contam uma história

Entrevista a Raul Minh'Alma: "As pessoas têm de perder o complexo de dizer que vão ao psiquiatra"

Book Stories, 06.12.20

Houvesse uma estrada das Índias até ao reino e e

 

‘Foi Sem Querer Que Te Quis’ foi o livro mais vendido de 2019. Qual é a expetativa para o ‘Durante a Queda Aprendi a Voar’?

A expectativa é a de que corresponda às expectativas dos meus leitores mais fiéis. Àquelas que gostam do meu trabalho. Mas, acima de tudo, é que possa ajudar muita gente, nem que seja dando-lhes mais esperança. Em termos de vendas está acima de qualquer outro livro até ao momento, mas não tenho expectativas específicas.

Como é que se sentiu ao ver que o seu livro foi o mais vendido do ano passado?

Senti-me orgulhoso e honrado porque trabalhei o ano inteiro para esse objetivo e alcancei-o. Não foi com surpresa que recebi a notícia, mas foi com muita alegria.

‘Durante a Queda Aprendi a Voar’ fala de depressão, de família e de amor. Porquê escrever sobre depressão?

Já queria há algum tempo falar sobre esta temática e tinha invariavelmente de ser este ano pelo contexto atual e por, infelizmente, ser uma doença cada vez mais comum. Eu abordo sempre algum tipo de problemática nos meus livros e eu achei importante que este fosse o tema do meu livro de 2020. Espero dar esperança e força a quem ler o livro.

Como é que preparou a abordagem ao tema? (falou com profissionais, com pacientes…)

Estudei muito sobre o tema. Li, vi e ouvi muitas pessoas a falarem sobre o assunto. Entrevistei psiquiatras, visitei inclusive um hospital psiquiátrico, vi filmes etc. Contudo, não é um livro técnico, é, acima de tudo, ficção e trata-se de um romance. É, de facto, um tema central, mas o livro aborda muitas outras temáticas.

Os exercícios que vemos descritos no livro foram aconselhados por algum profissional da área da saúde mental?

Todos eles partem de exemplos reais, mas eu próprio também lhe dei o meu cunho pessoal, dando uso à liberdade que a ficção nos permite para conseguir passar a mensagem do livro, que é, acima de tudo, de esperança e de sensibilização. Não procuro curar ninguém, mas sim ser, quem sabe, um complemento a esse tratamento que deve sempre ficar a cargo dos devidos profissionais.

O Raul acompanhou alguma situação de depressão na sua vida pessoal?

Não vivi de perto essa experiência, embora conheça pessoas que passaram por ela.

Que análise faz da forma como a saúde mental é encarada pelos portugueses?

Existe claramente preconceito. Que também eu o tinha, mas quando comecei a estudar sobre o assunto tudo ficou mais claro e normalizado. Se vamos ao médico porque temos um problema em determinada parte do nosso corpo, também devemos ir ao médico quando temos um problema na cabeça. É simples. Felizmente há muitos profissionais disponíveis para nos ajudar, o que não há é à vontade para os procurar. Precisamente por causa desse preconceito. 

Considera que deve haver um investimento maior na saúde mental, não só em meios materiais e profissionais, mas também em campanhas de divulgação?

Mais em campanhas de divulgação e sensibilização. E o meu livro é mais uma forma de o fazer. Temos de publicitar isso para normalizar e quebrar esses preconceitos. As pessoas têm de perder o complexo de dizer que vão ao psiquiatra. Tal como não têm complexos de dizer que vão ao dentista. O mal é não procurarem ajuda. 

Considera que existe preconceito para com as pessoas que sofrem de doenças mentais?

Muito, como digo acima. Mas espero ter contribuído para o amenizar.

Em ‘Foi Sem Querer Que te Quis’ o senhor Nicolau dá-nos a receita para ser feliz no amor. O Raul vai dizer-nos qual é a receita para ser um sucesso de vendas?

A receita é escrever livros em que as pessoas se revejam e saibam, a priori, que vão aprender alguma coisa e que vão evoluir enquanto pessoas durante a leitura. Acho que muita gente me lê porque sabe que, de alguma forma, vai encontrar ali respostas que nem sabia que procurava.

Até ao momento li apenas o ‘Foi Sem Querer Que te Quis’ e o ‘Durante a Queda Aprendi a Voar’, mas apercebi-me de algumas semelhanças: o casal é sempre composto por um elemento mais afortunado do que o outro (monetária e sentimentalmente) e o mais afortunado em termos de dinheiro é também o que tem maiores fragilidades emocionais. Que mensagem quer passar com personagens construídas desta forma?

Por acaso nem tinha reparado nisso, pelo que não há, pelo menos conscientemente, uma intenção ou mensagem particular sobre o aspeto da classe social. Em termos emocionais sim, porque a dualidade é importante para haver uma transferência de energia e conhecimento e criar uma dinâmica da narrativa. Além de a tornar mais heterogénea.  

Outra das semelhanças diz respeito às cenas de sexo. O homem surge sempre como estando mais à-vontade e tendo mais experiência sexual do que a mulher, o que faz com que seja ele a conduzir o momento sexual. Porquê?

São apenas dois homens e duas mulheres, pelo que não acho que seja suficiente para se considerar uma regra. Tem a ver com a personalidade dos personagens, com os momentos, com a relação entre ambos, etc. Como em todas as restantes cenas da história, não só as de sexo. Certamente haverá pessoas que hão de preferir de outra forma. É consoante o gosto de cada um.

E há ainda o facto de a mulher ser a personagem principal, no sentido em que vemos, maioritariamente, a história pelo ponto de vista dela. Porquê?

Eu escolho o ponto de vista da história que eu entendo ser o mais interessante para o leitor e para a narrativa e tem acontecido serem personagens femininas. Ainda que, ao contrário dos dois livros anteriores, neste livro o narrador é externo. Portanto nesse aspeto já diferencia dos anteriores precisamente porque me interessava também abordar os pontos de vista de outros personagens. Mas isso é definido em função da história que pretendo contar.

“A minha missão é, acima de tudo, dizer. Dizer algo que valha a pena ler ou ouvir. E quando não for capaz de o fazer espero ter o discernimento necessário para me retirar”. Esta frase foi dita pelo Raul numa entrevista. Seis livros depois ainda tem muito para dizer? Ou sente que já lhe faltam as palavras? 

Eu acabo cada livro completamente esgotado e sem nada mais para dizer. Não tenho absolutamente ideias para mais livros nenhuns porque ponho tudo o que tenho em cada livro. Mas isto é assim desde o primeiro livro, praticamente. Pelos vistos ainda vou tendo o que dizer e contar.  

Como descreve o atual panorama da literatura nacional?

Há, com certeza, muitos bons escritores, contudo penso que não estejam a conseguir chegar ao público. Porque também temos muitos leitores. Eu tenho a certeza. A ponte entre o livro e o potencial-leitor é que não está a funcionar da melhor forma.

O próximo livro já está a caminho?

Não. Ainda estou de ressaca deste (que me levou ao limite) e estou demasiado concentrado na sua promoção. Haverá tempo de assentar a poeira e refletir sobre novas histórias.

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