'A Oficina dos Livros Proibidos' e mais apetecidos
'A Oficina dos Livros Proibidos', de Eduardo Roca, foi publicada em Portugal pela Marcador em 2013.
Sinopse:
Colónia, alvores do século XV. Ares de reforma e de mudança assolam uma Europa governada ainda pelas superstições e velhas crenças. A difusão do saber está em poder de uns poucos. No entanto, um pequeno grupo de sábios e eruditos que se reúne na mais absoluta clandestinidade está ligado por uma ambição comum: a transmissão cultural ao povo. Como? Através dos livros. Antes, porém, terão de se esquivar das reticências da Igreja - que não deseja que obras «perigosas» como os Evangelhos cheguem ao povo - e das dos nobres - que não querem perder os seus privilégios. Só um homem, um modesto ourives chamado Lorenz, ajudado pela filha, será capaz de aceitar o desafio. Mesmo que o preço que poderia pagar por semelhante ousadia seja o mais caro: a sua vida e a de todos aqueles que o rodeiam.
Opinião:
A sinopse do livro encantou-me, especialmente pelo tema, mas o mesmo não pode ser dito da obra em si.
A premissa principal da história é a divulgação cultural e literária no século XV praticamente inexistente, uma vez que a cópia de livros era uma função quase exclusiva do clero. Os interesses instalados há séculos queriam manter este cargo como apenas seu, uma vez que o saber é uma forma de libertação e não lhes convinha que as classes mais baixas da sociedade tivessem acesso a informação, pois tal implicaria uma inevitável revolta no saber e nos costumes.
Aliás, o livro que a Igreja mais temia que fosse copiado em larga escala era, precisamente, os Evangelhos, pois eles perderiam o poder de moldar a interpretação dos crentes à sua medida.
As personagens
Assim, Eduardo Roca apresenta-nos Lorenz, um jovem viúvo que vive com a filha Erika e que trabalha numa oficina de ourivesaria. Antes de se ter tornado aprendiz de ourives, Lorenz tentou a sua sorte candidatando-se a um cargo de copista, mas por uma razão que não vou revelar não pôde seguir o seu sonho.
Nikolas, por sua vez, é um homem misterioso, conceituado e respeitado entre a alta sociedade de Colónia. É o dono de uma oficina de copistas e o escolhido pelos nobres da cidade para a cópia de grandes obras. Mas Nikolas é também o dono de uma outra oficina, esta ilegal, e é também protagonista de uma história que só é dada a conhecer na segunda metade do livro.
Há ainda o jovem Alonso, surdo, que crescerá ao longo da história enquanto personagem e enquanto homem.
Existe um enorme número de personagens que apenas faz aumentar o número de páginas do livro, contribuindo para uma certa confusão – confesso que, pela primeira vez, tive de fazer apontamentos para saber quem era quem!
Mas há também personagens interessantes que, pelas suas vivências e diferenças sociais, tornam a história cativante, como é o caso de Helmuth, que trabalha para Nikolas e cuja história me começou a interessar para depois ter um fim que me desiludiu (odeio quando começo a gostar das personagens em vão); existe também a dona de uma hospedagem (que personifica o quão dura era a vida de uma mulher viúva naqueles tempos), os vizinhos de Lorenz e de Érika e o padre Martin, aquele que nos faz ter alguma esperança nos membros do clero. No entanto, há também o arcebispo Von Morse que é o ‘diabo feito em gente’ e que apenas lhe interessa o seu prestígio e poder (lá se vai a esperança na instituição Igreja).
A história
Os primeiros capítulos permitem-nos conhecer Lorenz, o seu trabalho, a sua história e a sua filha. O seu gosto pela leitura vai levá-lo a conhecer um grupo de homens intelectuais que têm como objetivo partilhar informação, para que esta não morra entre as mãos do clero, da nobreza e da realeza.
Este gosto vai levá-lo a criar uma máquina perigosa: perigosa para a sua vida, para a vida dos que o rodeiam e para a sociedade tal como é conhecida e o leitor consegue acompanhar com grande deleite as várias fases deste processo.
O autor preocupou-se em contar-nos a história de praticamente cada uma das personagens, o que arrasta um pouco a leitura.
Aliás, a narrativa é lenta ao longo das 559 páginas, acelerando à medida que nos aproximamos do fim. Além de lenta torna-se cansativa porque existem demasiadas personagens, sem importância de maior para a história a quem são dadas honras de capítulos próprios, como é o caso do burgomestre Heller, dos piratas e de um pobre mercante caído em desgraça para que Heller safasse a sua honra política.
Durante as quase 600 páginas que tem o livro acompanhamos não só a história e a façanha de Lorenz, como nos apercebemos dos jogos de interesses existentes entre o arcebispo e vários nobres, bem como as chantagens existentes entre homens de poder, ou seja, o pior da sociedade humana.
É interesssante como a Erika vai crescendo, enquanto mulher e personagem, e nós nem nos damos conta. Só quando nos aproximamos do fim é que percebemos que, afinal, ela sempre foi importante, sempre esteve lá.
De nada serve a sabedoria se não juntarmos um coração nobre
Conclusão
O final da história foi um pouco repentino e até romanceado demais, tendo em conta a crueza de toda a narrativa. Mas quando filtramos o livro das personagens desnecessárias e dos diálogos infrutíferos, o que fica é um bom livro com uma premissa muito importante: o poder do conhecimento.
Eduardo Roca consegue, com esta obra, fazer-nos refletir sobre como era a vida antes da revolução da imprensa e mostrar-nos quão constrangidas de conhecimento viviam as classes baixas naquela época.
Sem dinheiro, sem recursos, a viver na miséria e sem saber ler. Era assim que o clero os queria, pois era isso que lhes permitia manter o poder que lhes havia sido confiado. Tal como a nobreza e grande burguesia.
📖
☝️ Pontos Positivos: a reflexão sobre a sociedade do século XV e como a evolução foi positiva para o mundo; a importância da difusão do conhecimento.
👇 Pontos Negativos: Demasiadas personagens, muitas sem grande importância para a trama, que atrasa a leitura e confunde o leitor.
⭐ Avaliação: 3,5 estrelas