‘Os Crimes Inocentes’ que mostram o estado a que chegámos
O livro 'Os Crimes Inocentes' foi publicado em 2018 pela Planeta Editora
Gabriel Magalhães é o autor de ‘Crimes Inocentes’ e de outras obras como ‘Não Tenhas Medo do Escuro’ (que recebeu o prémio Revelação na categoria de ficção da Associação Portuguesa de Escritores), ‘Planície de Espelhos’, ‘Madrugada na Tua Alma’, entre outros.
Sinopse
Um homem aparece assassinado no salão principal do Museu dos Coches de Lisboa, com uma lança atravessada no ventre.
Ao longo dos dias seguintes, morrem misteriosamente mais pessoas.
Um livro inteligente e divertido, que ajuda a perceber a sociedade portuguesa e as suas elites, a partir de uma sucessão de crimes que assentam na ganância, vaidade e desejo de poder.
Uma obra que percorre os lugares mais emblemáticos de Lisboa e oferece uma visão irónica dos bastidores da cultura e da política, com os seus jogos e guerras.
Opinião:
Mais uma estreia no meu caminho literário: Gabriel Magalhães.
Apesar de já ter vários livros publicados, confesso que ainda não tinha ouvido falar deste autor. No entanto, ler ‘Os Crimes Inocentes’ revelou-se uma agradável surpresa.
O que ao princípio parece apenas uma história de uma jovem precária que pretende transformar-se em detetive acaba por se revelar, afinal, numa deliciosa crítica à sociedade destes tempos.
Lembrou-me Eça de Queiróz – na crítica, não no estilo requintado da escrita.
Gabriel Magalhães escreve de forma simples e direta, sem grandes floreados, criando personagens que, se pararmos para pensar, todos conhecemos pelo menos uma na nossa vida.
A história decorre no ano de 2015, em pleno início de recuperação da crise económica que obrigou Portugal a pedir um resgate externo. A troika veio em força com exigências em troca de dinheiro e o Governo colocou em prática as demandas que levaram à ruína de muitas famílias, seja económica, seja social.
É neste meio-ambiente que as personagens deste livro deambulam, sempre com receio de serem despedidas pela troika.
O Museu Nacional dos Coches (o antigo) é o palco principal desta narrativa. Um conjunto de mortes estranhas levam Rosarinho, leitora assídua de policiais, a assumir o pulso à investigação, uma vez que o inspetor Marques, da Polícia Judiciária, pouco faz além de dizer: “um gajo tem de aturar cada coisa”.
Ao longo das 404 páginas conhecemos um pouco melhor os funcionários do Museu e as suas particularidades, os seus receios e as suas ambições.
E só no final, quando o mistério das mortes começa a ser desvendado, o autor aguça a crítica à sociedade portuguesa do século XXI pela voz da Rosarinho, a detetive que descobre a origem das mortes e até – imagine-se! – o mistério do desaparecimento da cadeira da qual Salazar caiu.
É uma obra bem construída e de fácil leitura. As descrições do local ou das personagens permitem-nos visualizar na nossa mente, com a maior perfeição, a Rosarinho, o doutor Mascarenhas, o detetive Marques, a dona Alda, a dona Constança e a execrável Márcia.
Sentimos um aperto no coração quando conhecemos melhor o Batista e sentimos pena do Santos (o primeiro a morrer) quando descobrimos os meandros da sua existência.
É um livro que nos faz pensar na vida: no que é importante para nós e na forma como encaramos a nossa existência diária.
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☝️ Pontos Positivos: a perspicácia da narrativa que nos prende e a clareza da escrita que nos permite visualizar os cenários e as personagens. A declaração de amor da Rosarinho à cidade de Lisboa
👇 Pontos Negativos: No final, quando se descobrem os mistérios das mortes, o autor divaga demasiado quando comparado ao resto do livro. Parece querer fazer render o desvendar do mistério
⭐ Avaliação: 3,8 estrelas